quinta-feira, 18 de junho de 2015

Crônica e transitividade verbal



                                                                
NAMORADOS - Luís Fernando Veríssimo
NAMORO












Luís Fernando Veríssimo
 
O melhor do namoro, claro, é o ridículo. Vocês dois no telefone:
            - Desliga você.
            - Não, desliga você.
            - Você.
            - Você.
            - Então vamos desligar juntos.
            - Tá. Conta até três.
            - Um...Dois...Dois e meio...
            Ridículo agora, porque na hora não era não. Na hora nem os apelidos secretos que vocês tinham um para o outro, lembra?, eram ridículos. Ronron. Suzuca. Alcizanzão. Surusuzuca. Gongonha. (Gongonha!) Mamosa. Purupupuca...
            Não havia coisa melhor do que passar tardes inteiras no sofá, olho no olho, dizendo.
            - As dondozeira ama os dondonzeiro?
            - Ama.
            - Mas os dondonzeiro ama as dondonzeira mais do que as dondonzeira ama os dondonzeiro.
            - Na-na-não. As dondonzeira ama os dondonzeiro mais do que etc..
            E, entremeando o diálogo, longos beijos, profundos beijos, beijos mais do que de língua, beijos de amígdalas, beijos catetéticos. Tardes inteiras. Confesse: ridículo só porque nunca mais.
            Depois do ridículo, o melhor do namoro são as brigas. Quem diz que nunca, como quem não quer nada, arquitetou um encontro casual com a ex ou o ex só para ver se ela ou ele está com alguém, ou para fingir que não vê, ou para ver e ignorar, ou para dar um abano amistoso querendo dizer que ela ou ele agora significa tão pouco que podem até ser amigos, está mentindo. Ah, está mentindo.
            E melhor do que as brigas são as reconciliações. Beijos ainda mais profundos, apelidos ainda mais lamentáveis, vistos de longe. A gente brigava mesmo era para se reconciliar depois, lembra? Oito entre dez namorados transam pela primeira vez fazendo as pazes. Não estou inventando. O IBGE tem as estatísticas.
            Na última briga deles, a Suzana conseguiu fazer chegar aos ouvidos do Alcyr que estava saindo com outro. Um colega do trabalho. E o Alcyr fez a coisa sensata, o que qualquer um de nós faria. Passou a espionar a Suzana escondido. Começou a faltar a sua aula de especialização em ciências contábeis às 6 para ficar atrás de uma carrocinha de pipoca, vendo se a Suzana saía do trabalho com o outro. Rondava a casa da Suzana. Uma noite, uma sexta-feira, pensou ver a Suzana entrar em casa com um homem - e não viu o homem sair da casa.       Quatro da manhã e o Alcyr abraçado a uma árvore, tremendo de frio, de olho fixo na porta. Todas as luzes da casa apagadas e o Alcyr pensando, quase chorando: não pode ser, não pode ser. Como é que o seu Amorim e a dona Laurita deixam? Eu, eles botavam na rua às onze e meia. O outro, deixam dormir com a Suzana na sua própria cama. Porque a Suzana só podia estar na cama com o outro. Àquela hora, não podiam estar mais no sofá, ela chamando ele de Dondozeiro. Ou podia? Não podia. Podia, não podia, o Alcyr não se agüentou, pulou a cerca, se agachou sob a janela da Suzana, bateu com o joelho em alguma coisa, gritou, e quando o seu Amorim apareceu na porta dos fundos e perguntou "Quem é que está aí?" tentou imitar um cachorro. Não convenceu ninguém, claro, tanto que, dez minutos depois, estava sentado na mesa da cozinha, tiritando, as calças sujas de barro, tomando o café da dona Laurita com uma mão, e o outro braço em volta da cintura de Suzana. Sim, reconciliados, abraçados, emocionados. Pois Suzana se enternecera com o ciúme do seu Ipsilonezinho. Não havia outro nenhum, ela fora à farmácia com o pai, o homem que ele vira entrar em casa com ela era o seu Amorim, bobo! Mas o que realmente conquistara Suzana fora o ganido do Alcyr, tentando imitar um cachorro. Só um homem muito apaixonado faria um ridículo daqueles. Em dois meses estavam casados.
            Até hoje a Suzana conta a história do Alcyr ganindo no quintal, por mais que ele peça para ela não contar. As crianças já cansaram de ouvir a história, os amigos ouvem um pouco sem jeito. E a Suzana e o Alcyr não se tratam mais por apelidos. Quando fala nele, ela diz "Esse daí". Mas que foi bom, foi.




VOCABULÁRIO
1) ENCONTRE, NO TEXTO, PALAVRAS QUE SIGNIFIQUEM:
a) equilibrada __________________b) uivo: _____________________                   
c) tremendo: ___________________
2) O QUE O PERSONAGEM QUIS DIZER COM A EXPRESSÃO “QUE HORAS TU LARGA”?
_________________________________________________________________________________________
INTERPRETAÇÃO TEXTUAL
1) O EXTREMO DO RIDÍCULO, SEGUNDO O NARRADOR FOI:
a) imitar um cachorro para não ser descoberto         c) convidá-la para um chope    e) transar para fazer as pazes.
b) abraçar uma árvore..                                          d) apelidar a pessoa amada.

2) NO TEXTO, CONSIDERA-SE QUE O MELHOR DO NAMORO É O RIDÍCULO ASSOCIADO
a) aos apelidos carinhosos.          c) às mentiras inocentes.             e) aos telefonemas intermináveis.
b) às reconciliações felizes.         d) às brigas por amor.

3) O QUE É, SEGUNDO O NARRADOR DO TEXTO, MELHOR DO QUE AS BRIGAS?________________________________________________________________________________________________________
ATIVIDADES GRAMATICAIS
1) SUBLINHE OS VERBOS NAS FRASES A SEGUIR E CLASSIFIQUE-OS. EM SEGUIDA, CIRCULE OS COMPLEMENTOS VERBAIS, CLASSIFICANDO-OS TAMBÉM.
a) “O ipsilone no nome lhe dava uma certa segurança.”

b) “Desliga você.”

c) “Só um homem muito apaixonado faria um ridículo daqueles.”

d) “Pois Suzana se enternecera com o ciúme do seu Ipsilonezinho.”

e) Alcyr era solteiríssimo.

f) Quando fala nele, ela diz “Esse daí”. 

g) “Não interessa.”            

2) CLASSIFIQUE OS TERMOS SUBLINHADOS ABAIXO USANDO OD (objeto direto), OI (objeto indireto), PS (predicativo do sujeito):
a) Suzana conta a história do namoro deles. ___________
b) Alcyir lembra dos apelidos carinhosos. _____________
c) Alcyr ficou escondido no pátio. __________________
d) Suzana estava apaixonada por Alcyr. ______________
e) Alcyr chamava Suzana de dondonzeira. ____________

3) SUBLINHE OS PREDICADOS DAS FRASES ABAIXO, CLASSIFICANDO-OS  E INDICANDO SEUS NÚCLEOS:
a) Alcyr ficou escondido atrás da árvore.

b) “ A Alcyr exagerara”.

c) “Em dois meses estavam casados”.

d) Alcyr chegou atrasado no trabalho de Suzana.


e) “Que horas tu larga?”  

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